A CUECA DO MAGISTRADO
Por: Villas-Bôas Corrêa
O irreverente, malicioso e abundante
folclore político do Rio Grande do Norte ─ dos mais ricos que conheço ─
registra venerando caso, contado e repetido com todos os pormenores da
veracidade, desde nome, o dia, hora e local, envolvendo magistrado de reputação
ilibada, conhecido como modelo de honradez, severidade, biografia exemplar na
vida pública e no recato da austeridade doméstica.
Casado com senhora de virtudes
celebradas, com prole numerosa e alguns netos alegrando a casa, pautava sua
rotina com regularidade tão precisa quanto cronômetro suíço. Morava em Natal,
em casa ampla, com jardim e pomar, na praça principal. Do outro lado, o
edifício do Palácio da Justiça, com as marcas do tempo, sinais da imponência
castigada pelas paredes desbotadas, escadaria com degraus gastos.
Podia-se acertar o relógio: à mesma hora,
de segunda à sexta-feira, o desembargador atravessava a praça, em passo
cadenciado, impecável no terno completo, o indispensável colete, o relógio no
bolso, a corrente de ouro presa na casa do botão, tocava a aba do chapéu no
cumprimento amável aos conhecidos e desaparecia no palácio da Justiça. Ao final
do expediente, com o acréscimo de minutos para arrumar as gavetas, refazia o
itinerário.
Mas, lá uma tarde, na quentura do verão
nordestino, o desembargador regressou à casa, na forma do costume, dirigiu-se
ao quarto, seguido da esposa, para trocar o terno pela simplicidade das roupas
mais leves e usadas. Distraído, enquanto relatava as maçadas do dia, sacou o
paletó, desfez o laço da gravata, despiu o colete e arriou o suspensório para
livrar-se das calças.
A mulher, despejou a surpresa na irritação
da pergunta, a exigir explicação imediata:
- Horácio, onde você esqueceu a cueca?
Pilhado em flagrante, o desembargador
improvisou a saída na indignação, botou a boca no mundo, atroando aos berros:
- Ladrões! Roubaram a minha cueca!
Investigações minuciosas desvendaram, em
suas minúcias e fofocas, o romance do exemplar magistrado com a sua secretária.
<<<<<>>>>>
Artigo publicado no site de Villas-Bôas
Corrêa.
Em: 20/09/2010.
Nenhum comentário:
Postar um comentário