- O JUMENTO QUE DECIDIU UMA CAUSA -
Uma reforma na Constituição
Estadual deu poderes ao Governador Ferreira Chaves de fazer uma revisão na
magistratura, podendo aproveitar ou não os magistrados em exercício. Assim, os
que faziam oposição a seu governo foram aposentados com remuneração proporcional
ao tempo de serviço. Naquela época, juízes e desembargadores podiam manifestar
sua posição política, inclusive filiar-se a um partido. O Presidente do
Tribunal de Justiça, Desembargador Espírito Santo e o Juiz de Direito de Caicó,
o Dr. Felinto de Brito Guerra, entre outros, por não seguirem a corrente do
Chefe do Executivo, foram também incluídos na relação dos não aproveitados.
Para preencher as vagas dos que perderam as suas funções, vários juízes foram
nomeados. Hélio Galvão, em artigo publicado, declara que algumas foram
nomeações felizes e acertadas, principalmente as de Hemetério Fernandes e
Juvenal Lamartine. O Dr. Hemetério que, anos depois, fundou e foi o primeiro
Presidente do Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Rio Grande do
Norte, foi nomeado para a distante cidade de Martins. Desavenças por questões
de terra, algumas de antigas sesmarias, ocupavam boa parte do tempo do jovem
magistrado. Uma dessas questões foi a de dois “coronéis” que, irredutíveis,
disputavam um pedaço de terra. Na sua mesa de trabalho, na sala que dava para a
rua da pequena cidade, o Dr. Hemetério estudava o difícil processo contendo
antigas escrituras. Um dia, ainda às voltas com o complicado quebra-cabeça, é
despertado pela esposa, que o chama para o almoço. Da sala de jantar, ouve o
ruído surdo de pisadas, provavelmente, pensou de alguém que entrou sem se
anunciar. Falando alto, pede ao desconhecido para sentar-se enquanto terminava
de almoçar. Antes, convida-o para o almoço. Não obtém resposta, porque o
desconhecido era um jumento que, encontrando a porta aberta, penetra de sala
adentro e, pisando maio, vai direto ao birô do juiz. E, de apetite aguçado,
“almoça” as folhas amareladas das velhas e irrecuperáveis escrituras. Quando o
Dr. Hemetério retorna à sala, depara-se com o jerico ainda mastigando as
últimas porções do trabalhoso processo. Entre aflito e espantado, num gesto
impulsivo, avança na direção do animal, na tentativa perigosa de arrancar um
pedaço do processo à mostra. Mas o jumento, assustado, também, numa manobra
rápida, ganha a rua, passando pela porta escancarada. Preocupado, o magistrado
manda chamar os dois fazendeiros irreconciliáveis e narra-lhes o acontecido
irreparável.
Oferecendo-se para servir de
árbitro, convida-os para discutir e chegar a um entendimento. Sem outra opção,
aceitam a mediação do juiz. E chegam a um acordo, encerrando, assim, uma antiga
desavença.
- E, dessa maneira – dizia o Dr.
Aldo Fernandes a seus colegas, na Faculdade de Direito de Natal – pela primeira
vez na história um jumento concorreu, decisivamente, para resolver uma
complicada questão de terra.
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Do livro: HISTÓRIAS
QUE NÃO ESTÃO NA HISTÓRIA, de autoria do Professor Universitário José de Anchieta Ferreira – Editado
pela RN Gráfica e Editora Ltda – Natal – RN, 1989.
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