A DESMORALIZAÇÃO DE SÍSTOLE E DIÁSTOLE
Jornalista Carlos Chagas
Nunca entendi bem a diferença entre sístole e diástole, ou seja, os mecanismos cardíacos que orientam nosso sangue a fluir com maior ou menor intensidade pelas artérias. Quem primeiro transplantou essa imagem para a política foi o general Golbery do Couto e Silva, numa de suas complexas análises a respeito do processo de abertura política no governo Ernesto Geisel. A moda pegou e agora assistimos essas variações do fluxo sanguíneo chegarem aos partidos: eles vão ou não vão ser limitados pela cláusula de barreira ou desempenho?
Porque em certos períodos de euforia da reforma política, parece que o
Congresso votará dispositivos draconianos para acabar com a farra das
legendas menores e de aluguel, deixando que funcionem apenas cinco ou
seis partidos capazes de cumprir as rígidas exigências de uma lei nova.
Desapareceriam os partidos que apenas se locupletam no Fundo Partidário e
de outras fórmulas para seus dirigentes e fundadores ganharem dinheiro,
vendendo-se.
O problema é que logo depois segue-se o tempo de varrer para debaixo
do tapete essas propostas moralizadoras, em nome da liberdade de
manifestação. Ora o próprio Congresso, ora o Supremo Tribunal Federal,
consideram um atentado aos postulados democráticos proibir cidadãos de
formar os partidos que bem entendem, mesmo caindo no ridículo do
“partido do eu sozinho”. Sem esquecer os pequenos partidos históricos,
que não satisfariam as ditas e ansiadas novas exigências, como a de
disporem de percentuais significativos nas últimas eleições, espalhados
em razoável número de estados.
Resultado: quando determinado projeto encontra-se em vias de virar
lei, reduzindo por exemplo o vexame da existência atual de 35 partidos
abagunçando a prática política, logo a proposta é rejeitada ou
desfigurada a ponto de ser arquivada. E se deputados e senadores
sentem-se envergonhados de mandar a proposta para o arquivo, entra em
campo o Supremo Tribunal Federal para intrometer-se onde não deveria ter
sido chamado.
De qualquer forma, escafedeu-se o veto à proliferação de partidos
políticos, coisa que há um mês parecia próxima. Não se fala mais no
projeto, entre deputados e senadores. Uns por consideração e
solidariedade, outros por malandragem, a impressão é de que de novo
continuaremos com a desmoralização da existência de cada vez mais
partidos. Somando os que funcionam com os que se encontram em formação e
pedido de registro, logo somarão 70. Convenhamos, um absurdo, em
condições de desmoralizar sístoles e diástoles e de promover
considerável enfarte no sistema sanguíneo...
Publicado no Diário do Poder
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