O FUTURO SOMBRIO DE RENAN
Mel Bleil Gallo *
É cada vez mais incerto o destino do presidente do Senado, Renan
Calheiros (PMDB-AL). A três meses de deixar o comando do Congresso, o
alagoano se vê emparedado, como nunca antes. Ameaçado de tornar-se réu
no Supremo Tribunal Federal (STF) e com o próprio cargo em xeque, Renan
começou a testar suas armas em busca do apoio de seus pares e,
sobretudo, da lealdade do Planalto. Geralmente comedido, o senador subiu
o tom das críticas contra o Judiciário e ameaça avançar em projetos
contrários às diversas carreiras jurídicas. A faísca que deu início a
uma semana de turbulências foi o embate travado entre a Polícia Federal e
a Polícia Legislativa, órgão subordinado ao senador e acusado pela
Operação Métis de montar um esquema de contrainteligência para sabotar a
Lava Jato. Na quinta-feira 27, acolhendo uma representação do policial
legislativo do Senado Antônio Tavares, o ministro Teori Zavascki
suspendeu temporariamente a operação e puxou a investigação para o STF. A
decisão foi o primeiro sinal de trégua entre os poderes, após uma
sequência de ataques recíprocos.
Na terça feira 25, na esteira de declarações pesadas de Renan contra
integrantes do Judiciário, a presidente do STF, Cármen Lúcia, se recusou
a participar de uma reunião com os presidentes dos demais poderes. No
dia seguinte, a ministra colocou a espada de Dâmocles sobre a cabeça de
Renan: anunciou a data do julgamento que definirá se é constitucional ou
não que réus em ações penais admitidas na Corte estejam na linha
sucessória da Presidência da República. Apresentada pela Rede
Sustentabilidade, a ação será julgada na próxima quinta-feira 3 e pode
atingir diretamente o presidente do Senado, hoje o terceiro na linha de
sucessão para ocupar o Planalto no caso da ausência simultânea de Temer e
do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Renan, embora alvo de
12 inquéritos no STF, ainda não é réu. Mas pode virar em breve. Ele é
acusado de beneficiar uma empreiteira suspeita de arcar com a pensão de
uma filha que ele teve com a jornalista Mônica Veloso. A acusação foi
apresentada em janeiro de 2013, pelos crimes de peculato, falsidade
ideológica e uso de documento falso por supostamente ter recebido
propina da construtora Mendes Júnior. Sob a relatoria de Edson Fachin
desde junho de 2015, o processo pode entrar na pauta a qualquer momento e
determinará se o alagoano se tornará ou não réu na ação penal. O
presidente do Senado também é investigado em outros onze inquéritos do
STF, dos quais oito são relacionados à Lava Jato.
A agressiva resposta de Renan ao Judiciário verbalizou o que boa parte
do meio político defende sem pudores: um limite às investigações da Lava
Jato. Sem citar nomes, o senador disse que um “juizeco” de primeira
instância não poderia atentar contra um poder. A declaração fez com que
um grupo de juízes protocolasse uma representação por quebra de decoro
contra Renan no Conselho de Ética do Senado. A manobra corporativa não é
sem segundas intenções – caso eventualmente se concretize uma ameaça de
cassação, o alagoano dependerá dos colegas de parlamento para se manter
no poder. Na tentativa de atingir diretamente o meio jurídico, Renan
resgatou seu projeto que endurece a punição contra abusos de autoridade.
Mas nem mesmo seus aliados apoiaram a ideia, embora também estivessem
irritados com a presença da Polícia Federal nas dependências do Senado e
nos apartamentos funcionais. Cientes do apoio da população à Lava Jato,
não quiseram correr o risco de comprar uma briga pública com os
investigadores e manchar ainda mais a imagem dos políticos na opinião
pública. Sedento por vingança, o alagoano passou então a articular
abertamente a aprovação do fim da aposentadoria integral como punição
máxima aos magistrados e integrantes do Ministério Público acusados de
cometerem delitos graves. A iniciativa faz parte da Proposta de Emenda à
Constituição 505/2010, que tramita na Câmara dos Deputados. Visto como
uma tentativa óbvia de chantagear o Judiciário, o gesto foi considerado
inoportuno até entre os mais próximos de Renan.
trabalhar pela busca de apoio e lealdade do Planalto
Sem crise institucional
Desta vez, o responsável por envolver diretamente o Planalto na
polêmica foi o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Em vez de
seguir a linha apaziguadora adotada por Temer, Moraes defendeu a
operação e disse haver evidências de que os policiais legislativos
teriam agido “com a finalidade clara de obstrução da investigação (da
Lava Jato)”. Visivelmente irritado, Renan respondeu que Moraes “não tem
se portado como um ministro de Estado”. Em referência a episódios
anteriores, disse ainda que o ministro anda “falando mais do que devia e
‘dando bom dia a cavalo’”. Como resposta, senadores do círculo de Renan
já foram sondados sobre a possibilidade de convocar Alexandre de Moraes
a dar explicações formais sobre seus deslizes à frente da pasta à qual a
Polícia Federal está vinculada. Outra gafe foi o episódio em que
Moraes, durante a campanha eleitoral de um correligionário do PSDB,
antecipou publicamente a operação que prenderia no dia seguinte o
ex-ministro petista Antonio Palocci.
Pisando em ovos e corrigindo deslizes de sua própria equipe, Temer
tem se esforçado para driblar uma crise institucional e comemorou quando
foi confirmado o encontro de Renan, Rodrigo Maia e Cármen Lúcia no
Itamaraty, na última sexta 28. A maior preocupação do Planalto é
garantir a votação da PEC dos Gastos no Senado até dezembro e manter a
estabilidade institucional. Para tanto, o governo sabe que depende
diretamente da boa vontade de Renan e de seus aliados próximos, que
também darão o tom no ano que vem e serão decisivos para o andamento de
outras agendas, como a reforma previdenciária e trabalhista. Entre eles,
estão Eunício de Oliveira (PMDB-CE), hoje o mais cotado para ocupar a
cadeira de Renan em fevereiro de 2017, e Romero Jucá (PMDB-RR), que deve
assumir a liderança do governo. Já Renan, se sobreviver à devassa da
Lava Jato, pretende assumir a liderança do PMDB na Casa e, assim, manter
sua influência sobre a bancada. O caminho para chegar lá, no entanto,
será mais turbulento do que ele imagina.
A preocupação do Planalto é garantir a votação da
PEC do Teto dos Gastos no Senado até dezembro
PEC do Teto dos Gastos no Senado até dezembro
* Publicado na revista ISTOÉ
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