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terça-feira, 15 de agosto de 2017

POESIA POPULAR NORDESTINA

- UM CASAMENTO MATUTO EM CORDEL -
Poeta José Acaci

Por arte das trevalia
Um dia eu tava quentão
Saí mei dirleriado
Andano pelo sertão
Atrai de dançar um xote
Findei foi enchendo o pote
Lá no bar de Zé Rumão.
*
Dispois q’ueu tava melado
Muntei na minha jumenta
Catuquei nas anca dela
E fui no rumo da venta
A burra disimbestou
E a danada só Parou
Na porta da véia Benta.
*
Ainda in riba da burra
Sinti chero de panela
De bode, carne, canjica…,
De galinha cabidela…
Pensei q’ueu tava num sonho
Quand’eu vi um Santo Atonho 
Pulas brecha da janela.
*
Foi antão q’ueu m’alembrei
Que naquela sexta fêra
Era o dia do casóro
De Zabé cum Zé Tonhera,
E que no meu vai e vem
Cheguei no Sítio Xerém.
Conheci pela portera.
*
Seu Zé Tenoro me viu
E mandou eu dermuntá…,
Puxou logo uma cadera
E dixe: -venha pra cá!
Cumê galinha torrada
Beber ceuveja gelada
Tumá cana e proseá!
*
Um cunvite cumaquele
Era tudo q’ueu quiria!
Era quinem se um pobe
Tirasse na loteria.
Galinha, bode e cachaça!
Inda mais tudo de graça!
- Pra mim foi meu grande dia.
*
Era noite de San’João,
De forró, milho e fuguêra
E o povo das redondeza
Abriro suas portera
E fôro tudo in jumento
Pra assistir o casamento De
Zabé cum Zé Tonhera.
*
Entonce o juiz de paz
Moço decente e honrado
Anunciou o casóro
E disse uns palavriado
Que era chei de doutorixe.
Mais ô meno o que ele dixe
Vou fazer um apurado:
*
“Estamo aqui riunido
Pra mode fazer o casóro
Do fíi de Ontõe Conrado
C’a fia de Zé Tenóro
E pro ser gente de bem
Vai ser no Sitio Xerém
Invês de ser no cartóro.”
*
Virou-se pra Zé Tonhera
E foi preguntano a Zé:
- Quá sua naturalidade
Zé respondeu: - Cuma é?
Zé Tenoro se meteu,
E dixe: -Onde tu nasceu,
Cabeça de Batoré!
*
Zé dixe: Ara que pregunta,
Dessa assim ninguém merece.
Eu nasci na minha casa
Lá donde o riacho desce
Se tiver mais dessa mande
Eu sou do Sítio Pau Grande,
Todo mundo me cunhece!
*
O Juiz de Paz virou-se
C’aquele jeito sereno,
Oiô nos zói de Zabé
Rabiscou e foi dizeno:
Donde a sinhora nasceu?
Aí Zabé respondeu:
-Lá no Buraco Pequeno.
*
O juiz se espremeu
E cumeçô a surrí
E dixe: - Diga de novo,
Se adisponha a ripití.
Zefa dixe em tom ameno: 
- Sítio Buraco Pequeno
É lá adonde eu nasci!
*
Zé Tenóro deu um grito:
- Deixe de pregunta e ande!
E o juiz dixe: Eu num caso
Nem que o dregolado mande, E
ssa noiva ta dizeno
Que é do Buraco Pequeno,
Mas o noivo é do Pau Grande.
*
Desse jeito num dá certo
Escute bem meu apelo
Se o sujeito é do Pau Grande
Vai ser grande o pesadelo
Naquele bota num bota
Se ele botá descangota,
-Veja só que dermantelo!
*
Zabé cumeçô chorá
Melano a cara todinha…
O véi tirou a pexera,
Desembalou da bainha,
E gritou para o sujeito:
O sinhô tenha respeito
Que Zabé é fia minha.
*

Zabé foi limpar os zóio,
Sortô a mão de Tonhera.
Que aproveitou que Zabé
Estava inchugano as bera
Dos óio cas duas mão,
Se afastou da murtidão
E disparou na carrera.
*
Zé Tenoro nessinstante
Esqueceu-se do Juiz
E gritou: Fíi duma égua…,
Fio duma miritriz…,
Daqui você sai casado
Ou então vai ser capado
Pulo tronco da raiz.
*
E saiu a murtidão
Correno atrás de Tonhera
Uns cum pau, Ôtos cum peda, 
Ôtos cum faca pexera
Numa grande rumaria,
E Tonhera escapulia
Pro dento das quebradera.
*
Quano agarraro Tonhera
Dero umas dez chibatada
Qu’ele perdeu um sapato
E ficou cum as carça mijada
Truxero ele prum claro
Perto de Zefa ajuntaro,
E truxero a papelada.
*
Quando o juiz viu ca coisa
Estava ficano preta
Foi falar, mas desistiu,
Pigarreou, fez careta,
E dixe no pensamento:
Vou fazer o casamento
Antes que eu me cumprumeta.
*
E dixe: - Seu Zé Tonhera,
O sinhô qué se casar
Cum dona Zefa Tenoro
Pra nunca mai se apartar?
Naquele instante Tonhera
Sintiu a faca pexeira
No seu pescoço encostar.
*
Sentiu a ponta da faca
E lhe deu um farnizim,
Um trimilique nas perna,
Na barriga, um brubuim,
Cuma quem conta um segredo
Pulou pro riba do medo
E disbugaiou um sim.
*
O Juiz virou pa Zefa
E antes de cumeçar
Ela já gritou que sim,
Que quiria se casar,
Nessinstante Zé Tenoro
Dixe: Termine o Casoro
Que o povo quer forrozar.
*
O Juiz naquela hora
Teve um má prissintimento,
Mas resorveu preguntá
Ali naquele momento
Se lá no Sítio Xerém
Tinha pro lá um arguém
Que era contra o casamento.
*
Foi antão que ouviu-se a voz
De Xica de Ontõe Conrado
Que Dixe: - Esse Zé Tonhera
Já é um home casado,
É casado em Goianinha
Cum Vera, uma prima minha,
Nas orde do delegado.
*
O Juiz dixe danou-se,
Pra quê que eu fui preguntar!
Zefa dixe: - Nesse caso
Tomém num quero casar.
Tonhera virou de lado
E dixe eu tô dispensado,
E agora vou me mandar.
*
E escapuliu correndo
Sem ninguém correr atrás…,
Zé Tenoro dixe a Zefa:
Por arte do satanás
Pode o céu dá um açoite,
Se tu num casa hoje a noite
Antonce num casa mais.
*
Zefa meio arrependida
Ficou num canto calada.
Passou a mão na barriga,
Alembrou das ecapada
Cum Zuca do veio Duda,
Lembrou que tava buchuda,
E resorveu a parada.
*
Afastou-se assim de lado,
Assubiu numa cadera,
E gritou: Eu era noiva
Mas num amava Tonhera.
Pra festa cuntinuar
Eu pretendo me casar
Cum quarqué um que me quera.
*
Eu dixe: – É cumigo mermo,
Vamo casar nessinstante.
O Juiz fez o casóro
O forró seguiu avante
E até no raiar do dia
Foi só festa e alegria
Daquele dia em diante.
*
Assim termina essa história
Onde eu casei por acaso
Mas que deu foi muito certo
Nunca me trouxe um atraso
Vivo no Sítio Xerém
Levando chifre também,
Mas aí, … é outro caso.
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