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quinta-feira, 5 de abril de 2012

UM POUCO DA BIOGRAFIA DO CEL. JOÃO DAMASCENO DE ARAÚJO PEREIRA: O 'BODE PRETO'.

Recebo do amigo  George Stephenson Batista, profundo conhecedor da história  das famílias seridoenses, a seguinte 'missiva internetiana':

Grande Bira,

Estou encaminhando para você (anexo) um pouco da biografia do Coronel João Damasceno de Araújo Pereira (Bode Preto) que deixou milhares de decendentes em toda a região do Seridó, principalmente em Acarí, Jucurutu e Currais Novos.
Se lhe interessar coloque em seu Blog. Acho que seria bem interessante em razão dele ter sido uma pessoa muito poderosa do seu tempo e hoje é bastante esquecido.
Abraço,
George
Caro George: Seu pedido é uma ordem!
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Cel. João Damasceno de Araújo Pereira
Subsídios Genealógicos
e
Coletânea de Fatos da sua Vida

João Damasceno Pereira de Araújo, filho de Antonio Pereira de Araújo, e de Maria José de Medeiros, Antonio, filho por sua vez de João Damasceno Pereira ( 3º filho do 1º Tomaz de Araújo Pereira) e Maria José de Medeiros, filha do 3º Tomaz de Araújo. Casou-se aos quinze anos de idade, tendo sua esposa na época, apenas treze anos. O casamento foi realizado por sugestão do avô de ambos, o velho Tomaz de Araújo Pereira(3º), que já se achando cego, achou por bem casar a neta Tereza, a quem criava.
O Coronel Damasceno morou inicialmente na fazenda Bulhões, no Acari, localizado na bacia do Gargalheiras. Dirigiu a política acariense até 1868, quando a transferiu para o seu sobrinho e afilhado, Coronel Silvino Bezerra de Araújo Galvão, que a exerceu durante toda a sua vida.
Segundo Juvenal Lamartine, o coronel Damasceno foi um belo tipo de sertanejo: - alto, forte e notável cavaleiro, era muito respeitado, em todo o Seridó, por suas qualidades de caráter e por sua energia.
A estima que gozava entre os seus parentes, e o respeito que soube manter junto ao povo durante sua longa vida, o consagrou como um dos legítimos patriarcas seridoenses. A circunstância de ser neto de Tomaz de Araújo Pereira, primeiro presidente do Rio Grande  do Norte, após proclamada a independência do Brasil, irmão do Padre Tomaz Pereira de Araújo, Deputado provincial do Rio Grande  do Norte, nos períodos de 1835/37, 1838/39, 1840/41, 1848/49 e 1860/61 e vigário de Acari, durante mais de sessenta anos, concorreu para firmar seu prestigio, que soube manter por uma linha de conduta firme e igual, enquanto viveu. Faleceu em 13.11.1908
Nas Transcrições de fatos relacionados com o coronel Damasceno, observamos uma particularidade interessante na personalidade dele. Em alguns fatos ele age com muita rigidez e vigor como era do seu feitio e em outras ocasiões com muita espiritualidade.  
 
 
Transcrito do livro de Manoel Rodrigues de Melo “Patriarcas e Carreiros
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João Damasceno era alto, forte, de força agigantada. Fazendeiro, rico, poderoso, dono de muitas terras, possuindo cabroeira numerosa e organizada, era, no seu tempo, uma das maiores influências políticas no município de Caicó.
Desse patriarca, morador no Saco do Martins, contam-se coisas fabulosas. Entre outras destacamos a historia do cangaceiro Pereirão. Perseguido, procurado como um cão sem dono, Pereirão valeu-se do cel. Damasceno, pedindo-lhe proteção. Damasceno deu-lhe abrigo nas suas propriedades. Foi não foi Pereirão saía da linha. Terminou sendo despedido. Daí em diante desandou-se em insultos, pilheriando deus e o mundo. Damasceno soube e resolveu prende-lo. E foi pessoalmente. Aproximando-se do bandido disse: Oh! Pereirão! Quando o cangaceiro estendeu-lhe a mão ele atracou. Atracou e segurou. Dentro de dois minutos Pereirão estava no chão, devidamente amarrado. Conduzido ao Saco do Martins, foi, depois, levado à cidade do Caicó por homens de confiança... onde até hoje ainda se espera a sua chegada...
Conta-se que informado certa vez de que a policia pretendia farejar a sua casa do Saco do Martins, respondeu peremptório: “Diga ao Alferes que o Saco do Martins só tem uma entrada e não tem por onde sair”.
João Damasceno tinha uma fazenda em Currais-Velhos, onde vez por outra fazia estada. Um dia estava deitado, quando chega um comboeiro. – “Coronel, me dê um pedacinho de fumo que venho aqui com um dente que não agüento”... João Damasceno compreendeu a pilheria... Levantou-se e disse: - perai... Entrou, pegou um torquez e disse: “mostre o dente”... O cabra amedrontado, sem dor no dente, abriu a boca e mostrou um dente qualquer. O Coronel, fazendo finca-pé, arrancou o dente são. Depois, entrou, cortou o pedaço de fomo e entregou-lhe dizendo: - “pegue cabra, o pedaço de fumo pra você não andar aqui com mentira”... O “matuto desconfiado com a brincadeira escafedeu-se na caatinga”.
Inácio da Catingueira veio-o do Brejo, com idade de 20 anos, trazido pelo cavalariano Francisco Pedro de Queiroz, para o Seridó. Tornando-se muito conhecido pela sua inteligência e presença de espírito. Gracejador, pilhérico, em tudo punha a sua verve de negro benquisto e estimado. Catingueira nunca tinha ido à casa do sisudão do Saco do Martins. Passando certa vez por lá, arranchou-se, armando a sua grande rede de varanda no alpendre, tendo ao lado a amasia e a viola. Damasceno chegou e encontrou o negro feito gente no seu alpendre. Catingueira desmanchou-se em agrados e elogios. Damasceno entrou, agarrou a palmatória grande de miolo de aroeira e bradou: - “bote a mão aqui, negro”! O negro vacilou. Damasceno, fixando-lhes os olhos duros gritou para os cabras. O negro obedeceu. Damasceno deu-lhe uma dúzia de bolos e mandou-o armar a rede na casa do diabo - ... Catingueira desapareceu do Rio Grande do Norte, indo curtir suas magoas no extremo norte do país.



SENTE-SE, SEU DOUTOR!

Em um júri em Caicó, em que o réu era pessoa protegida por João Damasceno, o promotor, levantando-se para fazer a acusação, sentiu-lhe cair sobre os ombros duas mãos pesadas que só ferro. E quando tentou levantar-se, pela segunda vez, sentiu, como que lhe caírem dezenas de arrobas nos ombros, acompanhado dessas palavras: - Sente-se, seu doutor! Senta-se!... Diante da ameaça tão forte, só teve uma atitude, baixar a cabeça e sentar-se.
 
 
Transcrição de fatos relacionados com o cel Damasceno do livro de Janúncio Bezerra da Nóbrega “Revivendo o Seridó”.



O NEGRO ROCK, PERIGOSO BANDIDO E SALTEADOR DO NORDESTE


De tudo existe na face da terra. - Remanescente pelo trabuco e banditismo, ele chegou de fora, do meio do mundo, na povoação de Flores, zona do Seridó, hoje municipio de Florânia, conhecido pelo célebre bandido Rock, que aproveitando-se do atraso do sertão, plantava anarquia, desordens e crimes, por toda a parte... Desta feita, obrigara as moças de família de Flores a dançarem nuas num baile.
Naqueles tempos, que já vão tão distantes não havia policiamento nas cidades e vilas, muito menos nas residências dos fazendeiros, que distavam léguas umas das outras, ficando assim abandonadas dos plenos favores da justiça. – O negro Rock deixa flores depois de procedimentos inqualificáveis e assombrosos, que ecoavam por toda parte!
Com alguns dias, paira na propriedade Laginhas, em casa do senhor Chico do Rego. Depois de amedrontar o proprietário, intima-lhe a dar oito contos de réis ou a vida... – O proprietário, disfarçando, arma-lhe uma rede e convida-lhe em seguida aceitar almoço, descansar! – Põe as armas debaixo da rede. – Antes, porem, por detrás da casa, o salteado expede portador ao coronel Damasceno, no sitio Saco do Martins, pedindo socorre-lo do ataque que esta sofrendo.
O coronel que esta acompanhado do seu cunhado José Lopes, corre em socorro, tendo o cuidado de conduzir uma peça de cordas. Segundo planejara, em amarra-lo!  Chegaram em casa do assaltado, sutilmente, e verificaram que estavam almoçando. – Dentro de um segundo pulam a porta de baixo, e já encontram o negro acrobata no campo da luta! – Trava-se então renhida peleja entre os três, corpo a corpo! – A vantagem fica do lado do coronel Damasceno e Zé Lopes, que o imobilizaram e gritam para Chico do Rego, pedindo as cordas amarradas na correia da sela! – Este diante do espetáculo nunca visto, se encontra imóvel, tremendo demasiadamente atacado dos nervos, cheio de um medo pavoroso... – Zé Lopes, cansado da luta, mas, com o joelho na boca do estômago do bandido, diz para Damasceno, que podia apanhar as cordas! – Foi algemado o cangaceiro! – Não teve tempo de usar as suas armas na luta, constantes de punhais e clavinote de pedra. Fora preso, algemado, bem mobilizado... - Era mais uma fera nefasta que desaparecia no sertão nordestino.
Depois teve o destino que merecia o malfeitor!
Num juazeiro, ao lado da grota do maracujá, jazia um lugar pitoresco e esquisito, uma caveira e uma ossada humana...
Seria a decisão e destino que merecia do tribunal humano e divino. Se ficasse vivo, mataria de emboscada muitas vidas úteis, alem de depredações bárbaras inenarráveis de um bandido tarado, acostumado a toda espécie de crimes.
Para os curiosos sertanejos, corria a lenda que o bandido negro Rock, tinha sido enviado para Amazonas... Do Saco do Martins a Caicó distam cinco boas léguas. – Muitos dizem que o criminoso escoltado pela força pública da cidade escapulira do meio do caminho.
Assim como a sociedade se sente aliviada quando tiramos do pasto uma cobra cascavel, assim respiramos com a morte de um mal feitor! – Ele que tirava, roubava a tranqüilidade da família seridoense, como salteador e bandido.
O coronel Damasceno valente e disposto conseguiu impor respeito em toda a região! Com a palavra e conselhos, acabava com as questiúnculas existentes no meio. Os injustiçados só corriam até o seu império no Saco do Martins. Chefe da aristocracia seridoense era um sertanejo forte. Chefiou no reinado e na republica.

TRAVESSURA INCRIVEL DO XANDINHO

Naqueles tempos o coronel João Damasceno, do Saco do Martins, em Caicó, era bem característico. Criava cerca de duas mil reses nas suas fazendas e era importante chefe político da terra com muita influência nas adjacências. – Pela temporada do inverno, para amansar novilhas e seus bezerros, recolhia no curral, aproximadamente, 120 vacas paridas. Muitos tiradores de leite, pela madrugada; a cada um daqueles auxiliares, ganhava diariamente, a sua panela de leite, geralmente panelas que levavam dez litros de leite. – Faziam-se necessários alguns meninos ou outras pessoas para botar bezerros. – O Xandinho, rapazinho muito capeta, gerenciava os botadores de bezerros! – Em derredor dos potes, boa iluminação de um mourão para que nas horas escuras, se acertasse ao despejar a cuia de leite nas bocas dos referidos potes. Voltemos ao fato inédito. Aconteceu, então, que Simplicio, tirador de leite. Ao recolher a sua vasilha, notou que uma coisa dentro da panela subia e descia em mergulhos! – Bem reconhecido aquele bolo de fezes, o homem jogou a panela no pé da cerca, muito revoltado, quebrando-a. – Levado o fato ao coronel Damasceno, ele apurou, chamando a sua presença todos os botadores de bezerros, faltando, porém, Xandinho, que seria responsável por tal marmelada e astúcia.
À título de consolo, perguntou a Simplicio se ele tinha coragem de matar Xandinho! Este, enraivecido, afirmou que sim, desde que tivesse a sua proteção. – Pois bem; disse o coronel Damasceno: Ele foi ao cercado buscar os animais de campo. Passarão por debaixo daquele pé de juazeiro grande que você conhece. É o caminho. Carregarei o clavinote e você estará trepado em cima da árvore, para segurar o tiro... - Aproxima-se a hora, lá está o provável assassino para se vingar, de pontaria feita e segura para ver a queda...
Mais um momento; e o Xandinho vem muito satisfeito, feliz, com uma perna passada no pescoço do cavalo, arquitetando planos diabólicos, traquinos, cantarolando, como jovem despreocupado... Diz Simplicio: - É agora que aquele infeliz me paga! E apertando o dedo, Xandinho cai fedendo quebrando os quixos nas pedras! – Dirige-se para lá, para se certificar do defunto. - Xandinho havia sentido apenas o espanto do animal pelo pipoco e a queda! – O clavinote estava carregado apenas de pólvora. Mas, Xandinho estava querendo brigar pelo atentado...
O coronel Damasceno gozava com estas brincadeiras... Mas sentia agora a sua moral atingida, de condutor da sociedade e chefe de uma nobre região.
Xandinho era bom vaqueiro, honesto e trabalhador. Era contudo, sonso e astucioso; gostava de presepada, ou capiloçadas. Se acobertava do parentesco de cunhado, para pintar o sete...
Afora isto, amarrava a sua personalidade de homem de bem, no esforço honesto e trabalho.

A PIMENTA MALAGUETA
 
 
Corre o ano de 1908. O Céu sereno e limpo parecia render paz e quietude! Era uma daquelas tardes que os galos cantavam para quebrar a tristeza reinante pelo pátio. Nenhuma nuvem anunciava tempestade! – De repente se entumesce o horizonte! Era a natureza indicando a transformação.
Lá, no fim do horizonte, distante, uma família de retirantes aponta no pátio. Estava no meio do mundo, sem agasalho e sem teto.
Batera ao alpendre e pediram pouso! – Prontamente a fidalguia do sertanejo os atendeu!
Não demorou muito tempo eles revelaram que eram aciganados. Começaram a pedir uma coisa e outra, revelando as suas qualidades inferiores. Isto desagradou.
À boca da noite, com muito desplante e sem acanhamento, um cidadão meio pernóstico, pediu duas pimentas para fazer chá desinfetante, destinado a combater suas hemorróidas! Era demais!
O coronel Damasceno fez sinal que sim, mas num gesto de silêncio, que fosse preparado o chá de uma mão de pimenta! – Ele quando tomou aquele banho de assento, saiu doido, correndo, gritando e pedindo socorro! – A pimenta malagueta estava queimando mais que brasa!...
Deixa que queimou e ardeu tanto, que ele ficou bom!...
Aprendeu, porém, a não ser pedante e descabido.
Assim eram as caçoadas, com que ele gozava com os pernósticos.
Vivia o seu mundo, as suas peças delirantes para a sua vida sertaneja.

ENCONTRO DO CORONEL COM OS DOUTORES JUVENAL LAMARTINE E PEDRO VELHO 


Conta o Dr. Juvenal Lamartine de Faria, genro do coronel Silvino Bezerra de Araújo Galvão, que em 1901, acompanhando numa excursão Dr.Pedro Velho a Caicó; ao se aproximarem daquela cidade, surgiu em frente a uma encruzilhada da estrada, o coronel Damasceno, acompanhado de um pagem e disse: “Fui cangaceiro e ainda sei botar tocaia”!...- Eram os comprimentos de um amigo... De volta de outros pontos percorridos, estiveram no Saco do Martins, em casa do coronel Damasceno, onde passaram o dia e foram fidalgamente tratados. Tinha mais de setenta anos quando por esta ocasião.

Transcrito do livro de Pery Lamartine “Coronéis do Seridó”


ANJO GABRIEL
Miguel Puçá, famoso bandoleiro, autor de muitas mortes, tentara violentar uma mulher casada, na presença do marido; foi morto próximo a fazenda do coronel Damasceno, onde lhe armaram uma tocaia, justamente quando ele passava em frente se benzendo. No processo instaurado por essa morte, tentaram envolver o Coronel Damasceno, mas nenhuma prova foi feita que pudesse apurar a sua responsabilidade.
Dele contam-se muitas historiam interessantes e espirituosas. Uma delas é a seguinte: - Havia em Acari um rapaz metediço e pedante, com que Damasceno antipatizava. Na proximidade da festa da padroeira, Damasceno meteu-lhe na cabeça que devia, para impressionar as moças, aparecer na procissão, montado num belo cavalo e vestido do anjo Gabriel para saudar Nossa Senhora. Aceita a proposta, Damasceno mandou confeccionar a indumentária com as asas bastante longas e ofereceu-lhe o cavalo, que era um belo animal irrequieto. No momento em que a procissão se aproxima da igreja o rapaz toma a frente e diz, com toda ênfase:
Parai, parai Mãe de Deus
Parai, parai Soberana.
Neste momento, a um sinal de Damasceno, a música tocou a pancadaria e subiu uma girândola de foguetões. O cavalo disparou e desapareceu na caatinga, onde foram encontrar o pobre anjo Gabriel de asas quebradas e todo machucado. Dessas pilherias ele fez muitas quando rapaz.

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