PARTIDOS E FRAUDES ELEITORAIS (*)
Na Assembleia Constituinte de 1947, composta de trinta e quatro
deputados, a bancada do PSD era majoritária – vinte parlamentares, seguindo-se
a UDN com doze e o PSP com dois.
Os advogados eram em número de treze: Djalma Marinho, Sílvio Pedroza, José Nicodemos,
Israel Nunes, José Gonçalves de Medeiros, José Xavier da Cunha, Mário Negócio, Rodolfo Pereira, Arnaldo
Simonet, Manoel Varela, Túlio Fernandes, Antônio Soares Filho e Claudionor de
Andrade.
Os médicos viam em segundo lugar, em número de nove: Dix-Huit Rosado, Pereira de Macedo, Pedro
Amorim, Abelardo Calafange, José Fernandes de Melo, Raul Alencar, Aderson
Dutra, Ezequiel Fonseca e Creso Bezerra.
Empresários e proprietários rurais: Alfredo Mesquita, Aristóteles
Fernandes, João Bianor, Alfredo Santana e Teodorico Bezerra, perfazendo um
total de cinco. Um único dentista: Jofre Ariston. Apenas um jornalista: Walter
Wanderley. Dois funcionários públicos: Cosme Lemos e Antônio Pereira Dias, um
provisionado, Agostinho Santiago Brito. Um sacerdote: monsenhor João da Mata
Paiva. O único estudante era o então jovem Moacir Torres Duarte.
Outra figura que integrou a bancada pessedista, naquela casa, era
Teodorico Bezerra. Chegou juntamente com seu irmão, João Bianor, eleitos pela
região do Trairí.
Teodorico viria a ser também o presidente do PSD, no Rio Grande do
Norte, com a morte súbita do senador João Câmara. Proprietário rural e
hoteleiro (era quem explorava o Grande Hotel que pertencia ao governo),
construído na administração de Rafael Fernandes, quando era prefeito de Natal,
o engenheiro Gentil Ferreira, seu primo e da mesma região.
Figura polêmica. Apesar das poucas letras, era sabido. Exercia a
tradicional política clientelista e dominava o seu reduto que dava sempre
votações consagradoras. Era majoritário política e eleitoralmente no município
de Santa Cruz. Elegia dois sobrinhos:
Aluízio Bezerra e Jácio Fiuza.
Teodorico tinha prestígio no Estado e na esfera federal, sobretudo, na
cúpula pessedista, a poderosa cúpula que governou o país por muitos anos.
Os adversários acusavam-no de fazer fraudes nas votações e nos mapas eleitorais,
conseguindo modificar os resultados das urnas. E por conta dessas estórias,
verdadeiras ou não muitas delas entraram no folclore político brasileiro.
Contava ele com equipe especializada
em fazer campanha, eleição e apuração. Eram verdadeiros mestre nessa
arte difícil quando não existiam ainda os marqueteiros e os institutos de
pesquisa. À frente do seu grupo estava a figura inteligente de José Bessa,
competente articulador e promotor de eventos que reuniam correligionários,
administradores e amigos do “majó” Teodorico.
Dizia-se, na época não era somente do lado de Teodorico, mas
generalizado por todo o Estado, a importância da prática da “brejeira” que atemorizava as lideranças
interioranas.
Djalma Marinho contou-me, no seu bom humor, entre um gole de uísque e
uma baforada de cigarro americano, como nascera o nome de “brejeira”, expressão
nativa, como sinônimo de fraude eleitoral.
Estava, Djalma, numa eleição em São José do Campestre e foi chamada às
pressas para orientar o delegado do Partido num impasse que ocorrera na
apuração da urna. Ao entrar no prédio da prefeitura, onde se realizava a
contagem de votos, encontrou na entrada um matuto sentado num tamborete,
fumando um cigarro brejeiro:
- Amigo o que houve aqui? Indagou preocupado.
E o matuto respondeu inteligentemente:
“Parece que foi uma Brejeira que fizeram por aí”.
A denominação colou e passou a ser usada pelos políticos e colunistas
da grande imprensa, ganhando a boca do povo.
Inúmeras fraudes foram cometidas no Rio Grande do Norte, algumas
comentadas, outras abafadas. Mas, as da região de Teodorico, nas votações
proporcionais ganharam fama e enriqueceram o anedotário.
Diz-se que em Serra Caiada, hoje Eloi de Souza, reduto do promotor José
Lins e de sua família, em certa eleição, a brejeira
fora tão escandalosa que o voto do próprio Zé Lins não apareceu. E ele
ironicamente protestava:
- Tá certo que minha mãe e meu pai tenham me traído; que minha noiva
também, mas, eu que votei em mim...
O “majó” Teodorico era homem de gestos largos. Amigo dos seus
correligionários. Protegia-os, prestava-lhes solidariedade nas horas difíceis.
Daí sua liderança, sua força, seu domínio. Gastava dinheiro com as eleições,
apoiando e elegendo muita gente.
Exerceu a partir de 1950, diversos mandatos federais. Foi vice
governador em eleições direta, em 1962, conseguindo, através de emenda
constitucional que a eleição do vice fosse feita pela Assembleia Legislativa. É
que ele fora derrotado para o senado naquele ano e ficara sem mandato eletivo.
Era um homem prático. Dizia sempre que político sem mandato não valia
coisa alguma. Só servia para uma coisa: Levar chá de cadeira nos Ministérios e
nos gabinetes dos governadores estaduais.
Sempre o visitava, no Grande Hotel. Batíamos grandes papos e trocávamos
ideias. Numa fase em que estava no ostracismo político. Os militares o
perseguiram, chegaram a prendê-lo na Base Naval, a título de apurar denúncia de
desvio de dinheiro público em instituições e cooperativas que ele criara e
fundara. Queriam cassa-lo. Nada foi apurado e ele venceu todo essa batalha de
perseguições e humilhações.
Anos depois, ainda em plena revolução, elegeu-se deputado federal e em
seguida, deputado estadual – o seu último canto de cisne.
Perguntavam-lhe sempre: “Mas majó como é que o senhor ficou na Arena,
partido da revolução que o prendeu”. E ele respondia com a sua costumeira
matreirice: “Quem me prendeu não foi a Arena, foi o Exército”.
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(*) Transcrito do livro: ANOTAÇÕES
DO MEU CADERNO de autoria do jornalista TICIANO DUARTE. Editado
por Z Comunicação e Sebo Vermelho. Natal
(RN), maio de 2000.
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