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sábado, 1 de fevereiro de 2014

HISTÓRIA DO CANGAÇO


- MAIS FEROZES DO QUE OS CANGACEIROS,
 OS ASSASSINOS DE “COLCHETE" E “JARARACA”. –

Se não devemos considerar Lampião um santo, também não podemos considerá-lo um facínora na expressão da palavra. Esse homem temível poderia ter sido um cidadão honrado, se, em sua juventude despreocupada, não lhe houvessem despertado na alma o sentimento da vingança. Assim, adepto de Cristo, em vez de Lampião seguir as leis do Novo Testamento onde é aconselhado o perdão, seguiu, em toda a sua vida atribulada, o trilho da ditadura que regia os tempos vividos antes da vinda do Messias, quando o lema era “olho por olho e dente por dente”. A não ser o Padre Cícero, talvez nenhum outro homem leu dentro do coração do bandoleiro indomável, que, não raro, praticou atos de verdadeira caridade. O mesmo, porém, não podemos dizer dos demais cangaceiros que o cercava, onde o vamos encontrar verdadeiras bestas, criminosos por ofício, assassinos por prazer e ladrões por índole. Entre esses, deparamos com dois, cujos nomes espalharam o terror por todo o Nordeste.
Colchete e Jararaca eram dois espíritos completamente perdidos, muito embora usassem no peito medalhas santificadas e orações ostentando o nome de Deus. E Lampião, na qualidade de chefe, assumia a responsabilidade dos atos dos seus comandados e, consequentemente era o alvo do ódio de pessoas a figura do Rei do Cangaço como um fantasma do mal.
Colchete e Jararaca, sujeitos perversos, mas de formidável audácia, resolveram, quando o bando atacou Mossoró, tomar a trincheira do Coronel Rodolfo Fernandes. Colchete iria primeiro, sozinho e Jararaca ficaria de guarda. Confiante na sua força, Colchete entoou a “Mulher Rendeira” e avançou com seu passo de malandro. Jararaca avisou
- Óia, Colchete, fáis o sirviço direito qui dispois eu vô pra mode di acabá cum essas papagaiadas dos ‘macaco’. Sangra esse tar di coroné Rodorfo, qui o restoé cumigo...
Colchete interrompeu a “Mulher Rendeira” e respondeu, depois de haver cuspido para o lado em sinal de desprezo:
- O coroné Rodorfo, dentro di uma orinha, vai tá sirvindo di cumida de arubu.
E lá se foi Colchete saboreando por antecipação o momento de sangrar o destemido coronel que procurava defender a cidade, dentro da sua trincheira, armado até os dentes. Ao chegar junto a esta, Colchete e mais alguns cangaceiros que vieram auxilia-lo na empreitada, começaram a dirigir impropérios aos soldados entrincheirados. Súbito, uma bala atinge o facínora, varando-lhe o peito que nunca abrigara um sentimento piedoso. Jararaca ao ver o companheiro ferido correu com o fito de socorrê-lo. Porem, da Torre de São Vicente, onde estava entrincheirado o prefeito da cidade, guardado pelos soldados do cabo Leonel, uma saraivada de balas pões os bandidos em debandada e Jararaca é ferido, alvo do cabo que era em pontaria tão eficaz quanto Lampião.
Jararaca foi preso com vida. O povo, que em nada devia em maldade e instinto de vingança ao bando de Lampião, arrastou pela cidade amarrado pelas pernas o corpo de Colchete, vingando na morte o que não puderam vingar na vida. Algemado Jararaca, foi este conduzido para a cadeia do cemitério. Os soldados que o levavam, no sadismo frequente aos que não sabem ganhar, mostraram-lhe uma cova. Despreocupadamente, o preso olhou bem dentro do buraco e falou:
- Eu to carculando qui essa cova é pra mode di mi interrá.Agora vancês tão fazendo isso pruquê eu to nessa circunstança i cum as maão amarrada. Mais eu num vô dá a vancês u gosto de si gabá qui eu pedi pra num morrê. Mi mate logo di uma veis e fique vancês todos sabendoqui vancês vão matá u homr mais valente qui já pisou nessas terras...
O discurso “a Nero” do desgraçado bandoleiro foi interrompido por um tiro que um soldado deu-lhe na cabeça. E, sem julgamento, sem a defesa que todos os criminosos tem na terra dos civilizados, Jararaca ingressou no país das trevas. Seu corpo, ainda quente, foi jogado dentro da cova fria que, silenciosa, acolheu mais um infeliz valente, que se fosse nascido em um lugar onde houvesse a oportunidade de regeneração, talvez não chegasse a ser tão odiento e o o seu desassombro empregado em coisa úteis.
Lampião, o bandoleiro de quem todos esquecem as boas ações, os atos de caridade que praticou com pessoas e animais, o inicio  da vida sadia de sertanejo que apenas desejava trabalhar, a falta de apoio que sofreu da polícia do seu município quando da morte de seus pais e que é chamado de corvo asqueroso e feroz, de sicário sedento de sangue, de ladrão e salteador, ao ter conhecimento da forma pela qual morreram os seus homens, reuniu o seu bando e falou:

- Vancês tão vendo cumo são os “macaco” pessoá. Eles falam di nóis, mais nóis arrespeitemo os corpo quando a arma num tá mais lá. Nu instanto os “macaco” fios da puliça pegaram o corpo de Colchete e arrastaram ele na rua cumo si ele ainda tivesse sintindo as dô das pancadas. Adispois interraram Jararaca cum as carne ainda quente. Num perciso dizê mais nada. Vancês já sabe u que tem qui fazê agora quando incontrá cum o pessoa das volante. I agora, vamo rezá a Deus Nosso Senhor, pelas arma dos falecido.
E o bando todo ajoelhou-se em fervorosa oração...

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Do livro: ‘LAMPIÃO – REI DO CANGAÇO’ de autoria do estudioso do cangaço EDUARDO BARBOSA. Editora Tecnoprint S. A.- SP - 1984

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